PROBLEMA: A falta de pagamento pode levar o condomínio a suspender o fornecimento de gás e água.

 

SOLUÇÃO: Diante da comprovação do dano extrapatrimonial e da importância do serviço, o condomínio não pode interromper a prestação de recursos essenciais ao cidadão.


Condomínio não pode efetuar corte no fornecimento de gás como forma de coibir o condômino inadimplente a pagar as taxas condominiais em atraso, especialmente quando outros meios previsto em lei estão à sua disposição. Esse foi o entendimento da juíza Tatiana Lobo Maia, da 2ª Vara Cível de Parnamirim, ao analisar pedido feito por uma moradora de um condomínio da Zona Sul de Natal diante do corte no fornecimento de gás de seu apartamento diante de inadimplemento.

A moradora ajuizou ação judicial com pedido de indenização por danos morais e com pedido de liminar contra o Condomínio Spazzio Senna, alegando que é proprietária do imóvel situado neste espaço residencial, estando inadimplente com as taxas condominiais em virtude de dificuldades financeiras. Ela afirmou que em 12 de setembro de 2018 seu fornecimento de gás foi cortado e o hidrômetro havia sido suprimido pelo Condomínio. Em virtude da inércia do estabelecimento, a moradora registrou através de boletim de ocorrência o furto do hidrômetro do gás. Assim, pediu, liminarmente, que o condomínio seja obrigado a restabelecer o fornecimento de gás em sua unidade, sob pena de multa.

O condomínio informou que ajuizou a ação de execução de título, que está tramitando no 4º Juizado Especial Cível de Natal, contra a autora. Alegou, ainda, que a autora possui débitos desde 2015 até o corrente ano.O Spazzio Senna defendeu que a ação que praticou, além de devidamente autorizada em Assembleia, foi antecedida de comunicação acerca da existência de débitos, inclusive com a informação de possível corte do fornecimento do gás, oportunidade em que a moradora optou por se manter inerte ao chamado.

A instalação de hidrômetros individuais em condomínios é vista como uma estratégia não apenas para reduzir o consumo de água, mas também para facilitar a cobrança, evitando inadimplência. No entanto, o corte de água por falta de pagamento não pode ser feito arbitrariamente. Para que essa medida seja aplicada, é recomendável que esteja prevista na convenção do condomínio. Caso contrário, a atualização da convenção exige a aprovação de pelo menos dois terços dos condôminos, o que pode ser um desafio em grandes empreendimentos.

Embora alguns condomínios tenham adotado a prática de aprovar cortes de fornecimento em assembleia, essa decisão pode gerar riscos jurídicos. Não há legislação que proíba expressamente essa ação, mas se for realizada sem respaldo na convenção ou sem votação adequada, o síndico pode enfrentar processos judiciais.

A legislação civil prevê medidas para lidar com a inadimplência, porém sem permitir punições constrangedoras que prejudiquem física ou psicologicamente o devedor ou impeçam o uso pleno de sua propriedade. O Código Civil, por meio do artigo 1.335, garante ao condômino o direito de usufruir livremente de sua unidade e utilizar as áreas comuns conforme sua finalidade.

A questão sobre a possibilidade de o condomínio cortar o fornecimento de água e gás para obrigar inadimplentes a pagar suas dívidas envolve um debate jurídico complexo. O Código Civil estabelece que os condôminos têm a obrigação de contribuir para as despesas do condomínio proporcionalmente à sua fração ideal (art. 1.336), garantindo também o direito de acesso à unidade habitacional.

Em alguns casos, quando a instalação de abastecimento é feita por concessionárias como a Sabesp, a interrupção do serviço pode ocorrer diretamente pela empresa responsável, desde que o sistema instalado no condomínio permita essa prática. No entanto, quando essa medida parte do próprio condomínio, é essencial que esteja prevista na convenção condominial, cuja alteração exige aprovação de pelo menos dois terços dos condôminos.

Embora alguns entendam que a deliberação em assembleia pode autorizar o corte, há riscos jurídicos envolvidos. Muitos tribunais consideram que penalidades devem ter natureza estritamente patrimonial, não podendo restringir direitos básicos dos condôminos. O artigo 1.337 do Código Civil reforça essa ideia ao estabelecer que a responsabilidade pelo pagamento recai sobre o patrimônio do devedor, não sobre sua pessoa.

A imposição de medidas que restrinjam o acesso ou uso do imóvel, como o corte de serviços essenciais, pode ser considerada abuso de direito e autotutela ilegal. Além disso, apesar de alguns tribunais não condenarem o condomínio ao pagamento de danos morais em tais casos, medidas constrangedoras podem ser rechaçadas pela Justiça.

Portanto, embora o síndico tenha o dever de buscar o recebimento de taxas em atraso, incluindo a possibilidade de parcelamento e ações de cobrança, o corte de água e gás como forma de pressionar condôminos inadimplentes permanece uma questão controversa e juridicamente delicada.

João Neto

Advogado

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FONTES:

papocondominial.com.br

jus.com.br

jusbrasil.com.br

sindiconet.com.br

tagjuridica.com


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