NECESSIDADE: Alguém entrou na minha propriedade sem permissão, causando uma invasão e comprometendo minha posse legítima.

 

SERVIÇO: Solicitação para recuperar a posse legítima do imóvel.

A ação de reintegração de posse é um tipo de ação possessória que se distingue das demais previstas no Código Civil Brasileiro devido a suas particularidades. É essencial compreender suas diferenças em relação a outras ações possessórias, pois, apesar de compartilharem características comuns, cada uma se aplica a contextos específicos.

O objetivo das ações possessórias, de forma geral, é garantir a posse legítima de um bem. No caso da reintegração de posse, trata-se do restabelecimento do direito de posse de alguém que perdeu esse direito por conta de um ato chamado "esbulho"—isto é, uma invasão ou tomada indevida do imóvel.

Enquanto o proprietário tem direitos amplos sobre o bem, podendo utilizá-lo, usufruí-lo e dispor dele, o possuidor é aquele que detém a posse direta, como ocorre com locatários. A reintegração de posse ocorre justamente quando um possuidor perde sua posse injustamente devido a atos de violência, clandestinidade ou precariedade por parte de terceiros. Nestes casos, além de recuperar a posse, pode-se pleitear indenização por prejuízos sofridos.

Movimentos de invasão de propriedades costumam ser os exemplos mais comuns desse tipo de conflito. Vale ressaltar que, nesses casos, não se discute a propriedade do bem, mas sim a posse. Isso significa que um possuidor pode reivindicar sua posse mesmo contra o próprio proprietário, se este estiver agindo de maneira injusta contra o direito do possuidor—como ocorre em algumas disputas envolvendo imóveis alugados. Além disso, é relevante analisar como o Estado lida com esses processos, especialmente em situações que envolvem famílias de baixa renda.

A legislação de 2015 não trouxe mudanças na abertura da seção II, que trata da manutenção e da reintegração de posse. Os artigos 560, 561 e 562 são uma reprodução fiel dos artigos 927, 928 e 929 do Código de 1973, mantendo-se, portanto, a validade das interpretações doutrinárias sobre as ações possessórias daquela época.

Apesar da necessidade de estudar a doutrina da posse, é essencial não negligenciar o direito positivo que a rege, pois muitas das análises feitas por juristas ao longo do tempo não foram totalmente incorporadas ao Código Civil. Segundo Adroaldo Furtado Fabrício, a posse é um fato—a existência de uma situação de posse concreta—mas é também um fato juridicamente protegido. Dessa forma, sua qualificação deve ser buscada dentro do Código Civil brasileiro.

No primeiro Código Civil, de 1916, apenas o possuidor era reconhecido, enquanto atos de mera permissão ou tolerância não geravam posse. Além disso, atos de aquisição por violência ou clandestinidade só conferiam posse após o fim dessas condições (art. 497, posteriormente reproduzido no art. 1.208 do Código Civil de 2002).

Com a promulgação do Código Civil de 2002, houve uma definição mais clara da proteção possessória, distinguindo quem detém a posse (jus possessionis) daquele que tem direito sobre ela (jus possidendi). Isso não impede, contudo, a possibilidade de discutir, dentro de uma ação possessória, a chamada posse injusta—obtida por meios viciosos como violência ou clandestinidade—por meio da exceptio viciosae possessionis, que permite ao lesado contestar essa posse. O artigo 1.211 do Código Civil de 2002 determina que, caso haja disputa entre possuidores, manter-se-á provisoriamente aquele que detiver a coisa, desde que sua posse não tenha sido adquirida de forma viciosa.

O novo Código Civil trouxe uma distinção mais clara entre posse direta e posse indireta, assegurando o direito do possuidor direto de defender sua posse contra o indireto. De acordo com o artigo 1.197, a posse direta, exercida por quem detém temporariamente um bem por direito pessoal ou real, não invalida a posse indireta daquele que originalmente a concedeu.

No âmbito das ações possessórias, o artigo 560 do Código de Processo Civil de 2015 manteve a proteção já prevista no Código de 1973, estabelecendo medidas para a manutenção da posse em casos de turbação e para a reintegração nos casos de esbulho. Essas ações são fungíveis entre si, pois na prática nem sempre é fácil distinguir entre as situações.

O esbulho ocorre quando o possuidor é privado completamente do exercício de sua posse, enquanto a turbação restringe ou limita esse exercício, sem removê-lo por completo. Além dessas, há ainda a ameaça à posse, que indica a iminência de um esbulho ou turbação.

Já o artigo 561 do CPC/15 determina que, ao ingressar com uma ação possessória, o autor deve comprovar sua posse, demonstrar o esbulho ou turbação cometida pelo réu, indicar a data do ocorrido e esclarecer se ainda mantém a posse (nos casos de manutenção) ou se a perdeu (nos casos de reintegração). O Código de Processo de 2015 também preservou a regra das ações de força nova, permitindo que sejam ajuizadas dentro do prazo de um ano e um dia após o evento da turbação ou do esbulho, garantindo um procedimento ágil para a defesa possessória.

Após o prazo estabelecido, o processo seguirá o procedimento comum do Código. Se as exigências forem devidamente atendidas e comprovadas, o juiz responsável poderá conceder a proteção liminar, sem a necessidade de ouvir a outra parte previamente, expedindo o mandado de manutenção ou reintegração de posse, conforme o caso.

Essa decisão ocorre em um momento de cognição preliminar, ainda não completamente aprofundada, semelhante às tutelas provisórias incidentais, embora com fundamentos distintos. O Código de Processo Civil de 2015, nos artigos 294 e seguintes, trata da tutela provisória de urgência, antecipada incidental.

Caso o autor da ação não tenha cumprido satisfatoriamente as exigências legais, o juiz não determinará imediatamente uma medida processual contra ele. Em vez disso, exigirá que justifique previamente seus argumentos, convocando o réu para uma audiência específica.

Existe uma divergência doutrinária sobre a necessidade de prévio requerimento do autor para realização dessa audiência. Segundo Adroaldo Furtado Fabrício, ao comentar o antigo CPC/73, o juiz só poderia realizá-la se fosse solicitada na petição inicial. No entanto, há quem defenda que o magistrado tem o poder de convocar as partes sempre que julgar necessário, independentemente de requerimento prévio.

A audiência de justificação tem o objetivo exclusivo de fornecer ao juiz informações adicionais que fundamentem a concessão da proteção liminar. Nesta fase, o réu ainda não apresenta suas próprias provas, mas pode participar contestando testemunhas indicadas pelo autor, buscando eventuais contradições.

Se, ao final dessa audiência, o juiz constatar que há elementos suficientes, emitirá o mandado de manutenção ou reintegração de posse. Para casos envolvendo pessoas jurídicas de direito público, o parágrafo único do artigo 562 do CPC/15 exige que seus representantes sejam previamente ouvidos antes da concessão da liminar.

Por fim, uma questão relevante refere-se à recorribilidade da decisão que concede a proteção liminar em ações possessórias movidas dentro do prazo de um ano e um dia a partir do esbulho ou turbação. O novo CPC restringiu o uso do agravo de instrumento, eliminando a regra do CPC/73 que permitia recurso contra qualquer decisão interlocutória, salvo exceções expressamente previstas.

Com o Código de Processo Civil de 2015, o recurso de agravo de instrumento deixou de ser cabível contra todas as decisões interlocutórias do juiz de primeiro grau, passando a depender de previsão expressa do legislador. O artigo 1.015 elenca as situações em que esse recurso pode ser interposto, incluindo tutelas provisórias, conforme disposto no inciso I.

Embora a tutela liminar concedida em ações possessórias não se confunda com as tutelas provisórias previstas nos artigos 294 e seguintes do CPC, pode haver debate sobre a possibilidade de recorrer por meio do agravo de instrumento contra decisões sobre manutenção ou reintegração de posse (art. 563). No entanto, diante da dúvida, há quem defenda que o recurso deve ser admitido.

O artigo 564 estabelece que, concedida ou não a liminar, o autor tem cinco dias para providenciar a citação do réu, que poderá contestar no prazo de quinze dias. No novo CPC, a fase conciliatória do procedimento comum, prevista no artigo 334, não se aplica às ações possessórias.

Além disso, a redação do antigo artigo 219, § 2º, do CPC/73, que determinava que o autor promovesse a citação do réu, foi substituída no artigo 249, § 2º, do CPC/15 por uma formulação mais precisa: cabe ao autor apenas adotar as medidas necessárias para viabilizar a citação, que continua sendo um ato do Estado.

Por fim, o prazo para contestação, conforme disposto no parágrafo único do artigo 564, é contado a partir da intimação da decisão sobre a medida liminar, caso tenha sido realizada uma audiência de justificação prévia. Isso confirma a importância da correta aplicação dos procedimentos no âmbito das ações possessórias.

O artigo 565 do Código de Processo Civil trouxe um avanço significativo no tratamento das ações possessórias que envolvem litígios coletivos. Quando a turbação ou esbulho relatado na petição inicial tiver ocorrido há mais de um ano e um dia—caso em que a ação se enquadra nas chamadas "ações de força velha"—o juiz só analisará o pedido de proteção liminar depois de realizar ou tentar uma audiência de mediação, dentro de um prazo de 30 dias.

Apesar do caráter positivo da mudança, há críticas quanto à estrutura normativa adotada, especialmente pela forma como o § 1º remete aos §§ 2º e 4º, restringindo a aplicação ideal do dispositivo. O § 2º determina que o Ministério Público seja intimado para participar da audiência de mediação, assim como a Defensoria Pública, caso haja partes beneficiárias de justiça gratuita. Já o § 4º prevê a intimação dos órgãos responsáveis pelas políticas agrária e urbana das entidades públicas federativas, para que se manifestem sobre eventuais interesses no processo e sobre possíveis soluções para o conflito.

Esses dispositivos deveriam estar organizados antes do § 1º, pois este trata de uma audiência de mediação inicial para ações de força velha, na qual a participação do Ministério Público e da Defensoria Pública seria mais proveitosa, visto que o litígio ainda não está completamente consolidado. Em contraste, o § 1º trata de uma nova audiência de mediação que deve ocorrer após um ano da distribuição da ação, caso tenha sido concedida a liminar e esta permaneça sem cumprimento. Nesta fase, a probabilidade de um acordo é menor, pois as posições das partes já estarão bem estabelecidas.

O Código também disciplina o interdito proibitório em uma seção separada (Seção III), abordando seu funcionamento em dois artigos. Tanto o possuidor direto quanto o indireto podem solicitar ao juiz a proteção contra um esbulho ou turbação iminente por meio do mandado de interdito proibitório. A tutela concedida pelo magistrado pode vir acompanhada de medidas coercitivas para garantir seu cumprimento. Quanto ao procedimento, o interdito proibitório segue, com as devidas exceções, as regras estabelecidas para reintegração e manutenção de posse.

A reintegração de posse é frequentemente aplicada em casos de remoção de famílias que ocupam prédios públicos por falta de alternativas habitacionais. O Judiciário, nesses casos, geralmente considera os ocupantes como invasores, argumentando que a ocupação impede que o imóvel seja utilizado para sua finalidade original. Isso levanta um debate relevante sobre como o Estado conduz essas ações, especialmente contra famílias de baixa renda.

Em um caso específico envolvendo a TERRACAP, um agravo de instrumento foi analisado contra a decisão que determinou a desocupação de um imóvel objeto de interdito proibitório. A empresa alegou ofensa à coisa julgada, argumentando que a sentença não a obrigava a ser depositária dos bens de terceiros presentes no imóvel. Além disso, sustentou que há anos enfrenta dificuldades para retomar a posse do imóvel devido à falta de espaço físico no depósito público e à escassez de recursos humanos e financeiros para armazenar os bens. No entanto, a Desembargadora destacou que, sendo uma empresa pública com significativa capacidade econômica e um patrimônio imobiliário expressivo no Distrito Federal, a ausência de vagas no depósito público não justificava transferir esse ônus aos ocupantes. A Turma, ao negar provimento ao recurso, entendeu que a imposição de multa aos ocupantes geraria encargos excessivos sem garantir eficácia à decisão judicial.

No contexto da reintegração de posse, é fundamental que os requisitos legais sejam rigorosamente observados. Sem a comprovação da posse legítima, do esbulho, da data do esbulho e da perda da posse, não há fundamento para conceder a reintegração, tampouco uma liminar. Para aprofundar a compreensão do tema, os autores Luís Guilherme Marinoni e Daniel Mitidiero discutem os conceitos da ação possessória de imissão na posse e reintegração, esclarecendo suas particularidades e aplicações.

Em relação a bens públicos, a legislação estabelece que não há posse propriamente dita, mas apenas detenção. Isso significa que um particular que ocupe um imóvel público, independentemente do tempo de permanência, não pode reivindicar direitos possessórios sobre ele. Os tribunais já consolidaram esse entendimento, reforçando que a ocupação de um bem público não gera posse e, portanto, não confere ao ocupante proteção possessória.

O tempo de duração de um processo desse tipo é variável, já que ações que envolvem imóveis costumam ser demoradas. Em alguns casos, pode-se solicitar uma liminar para a retirada imediata do ocupante, mas essa medida não é garantida em todas as situações. Geralmente, a decisão judicial final estabelece um prazo para que o invasor deixe a propriedade e, caso descumpra a ordem, poderá haver intervenção policial para garantir a desocupação. Nesse contexto, os agentes de segurança podem acompanhar o cumprimento do mandado e, se necessário, remover a pessoa e seus pertences de maneira forçada.

Além da reintegração de posse, o proprietário pode requerer indenização pelos danos materiais causados pela ocupação indevida, dependendo das circunstâncias específicas do caso. Essas questões costumam ser analisadas individualmente pelo Judiciário, levando em conta os impactos da invasão e os prejuízos decorrentes da permanência irregular no imóvel.

 

João Neto

Advogado

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FONTES:

tjdft.jus.br

franzoni.adv.br

jusbrasil.com.br

jus.com.br

migalhas.com.br

folhadelondrina.com.br


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