PROBLEMA: Acesso ao Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS) para filhos com autismo.
SOLUÇÃO: A síndrome não está listada de maneira explícita na Lei nº 8.036/1990, mas o Poder Judiciário reconhece a possibilidade de liberar o FGTS para o trabalhador.
A Lei 8.036/90, em seu artigo 20,
especifica diversas situações em que é possível movimentar a conta do FGTS do
trabalhador, incluindo algumas doenças graves tanto do trabalhador quanto de
seus dependentes. No entanto, não há previsão específica para o autismo. É
evidente que os cuidados e investimentos no desenvolvimento e tratamento de
crianças e adolescentes autistas são caros e contínuos, e as terapias
necessárias são essenciais para garantir uma vida digna e de qualidade.
A lei menciona várias
circunstâncias em que o trabalhador pode sacar o FGTS, como em casos de
demissão sem justa causa ou para aquisição de moradia própria. Da mesma forma,
é permitido o saque quando diagnosticadas certas doenças graves. Contudo, a lei
não prevê expressamente a possibilidade de saque para pessoas ou dependentes
com transtorno do espectro autista (TEA). Dessa forma, ao procurar uma agência
da Caixa Econômica Federal, o trabalhador muitas vezes tem seu pedido de
liberação dos valores negado. É importante lembrar que o objetivo social do
FGTS é proteger a dignidade humana, e por isso o Poder Judiciário tem
frequentemente decidido a favor da liberação dos valores.
Para contextualizar, o autismo é
definido como "uma disfunção neurológica de base orgânica, que afeta a
sociabilidade, a linguagem, a capacidade lúdica e a comunicação"
(Classificação Internacional de Doenças - CID 10, publicada pela Organização
Mundial de Saúde).
Atualmente, as instituições
governamentais não estão preparadas para atender às necessidades especiais de
nossos filhos no custeio de tratamentos, medicamentos e terapias que são
necessários. Essa proposta visa alterar as leis sobre a retirada do FGTS, que é
um direito do trabalhador.
Considerando que é necessário
atender aos direitos fundamentais garantidos pela ordem constitucional, como o
direito à saúde, à vida e à dignidade humana, a 3ª Turma, por unanimidade, deu
provimento à apelação para autorizar o saque total da conta do FGTS,
determinando à Caixa Econômica Federal que proceda à liberação dos valores para
auxiliar no tratamento de seu filho, que sofre de autismo associado a retardo
mental. Votaram a favor os Desembargadores Marga Barth Tessler e Carlos E. T.
Flores Lenz. TRF da 4ª Região, 3ª Turma, AC nº 2000.70.00.009822-1/PR,
Relatora: Juíza Taís Schilling Ferraz, Sessão do dia 30-04-2002, Informativo
116.
Custear o tratamento de nossos
filhos é um direito à vida e propõe uma melhoria na qualidade de vida para
essas necessidades. Todos os pais sabem que após o diagnóstico de TEA,
inicia-se um novo desafio em busca de instituições e tratamentos que não são nada
baratos. Para isso, contamos com sua ajuda e opinião para, talvez, mudarmos
essa condição tão injusta que o governo nos impõe diante de tais dificuldades.
O Transtorno do Espectro Autista
(TEA) envolve várias patologias que afetam o desenvolvimento neurológico e
apresentam três características principais: dificuldade de socialização,
comunicação e comportamentos repetitivos. Essas síndromes variam em gravidade e
impacto. O autismo, que afeta mais os meninos, é caracterizado pela dificuldade
de interação social, como fazer amigos e expressar emoções, além de
comportamentos repetitivos. Os primeiros sinais geralmente são observados pelo
pediatra, que acompanha o desenvolvimento da criança e orienta os pais a
procurarem um médico psiquiatra ou neurologista para diagnóstico. O tratamento,
que é prescrito por esses profissionais, envolve uma equipe multidisciplinar
composta por psiquiatra ou neurologista infantil, psicólogo, psicopedagogo,
fonoaudiólogo, fisioterapeuta e terapeuta ocupacional.
A síndrome de Asperger, um tipo
de TEA, causa dificuldade de adaptação social. Muitas vezes considerada uma
forma leve de autismo, exige várias terapias caras. Por isso, a mãe de uma
criança com síndrome de Asperger solicitou judicialmente a liberação do saldo
do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS) para cobrir as despesas. A
síndrome de Asperger não é causada por privação emocional ou pela maneira como
os pais educam os filhos, e sua causa é desconhecida. As terapias necessárias
incluem treinamento de habilidades sociais, educação especializada, terapia
cognitiva e psicoterapia, terapia de interação sensorial, terapia de linguagem,
equoterapia e outras.
A legislação do FGTS não prevê a
liberação do saldo para pais de crianças com síndrome de Down, paralisia
cerebral, TEA ou síndrome de Asperger, sendo necessário obter uma ordem
judicial. No caso mencionado, a Juíza Federal Sabrina Ferreira Alvarez de Moura
Azevedo autorizou a liberação do saldo, reconhecendo que seu objetivo é
auxiliar o titular da conta em momentos de necessidade, devido a doenças
graves.
A realidade frequentemente chega
ao Judiciário, e é inconcebível que a Justiça ignore as necessidades da
população. Diversas decisões judiciais concedem o saque do FGTS para
trabalhadores e pais de pessoas com autismo, garantindo os direitos
fundamentais previstos na Constituição Federal e respeitando a dignidade
humana. Infelizmente, a concessão administrativa não ocorre como em casos de
neoplasias e HIV, sendo necessário ajuizar ação judicial, embora o trâmite deva
ser prioritário.
O tratamento de pessoas com
autismo envolve terapias multidisciplinares muitas vezes caras. O Judiciário
deve adaptar a lei aos direitos fundamentais, ampliando sua aplicação e
considerando a dignidade humana. O Superior Tribunal de Justiça (STJ) entende
que o artigo 20 da Lei nº 8.036/1990 é exemplificativo, pois não é possível
prever todas as situações que exigem proteção ao trabalhador. Assim, embora
extrajudicialmente a liberação dos valores seja difícil, judicialmente há
muitas decisões favoráveis para trabalhadores e dependentes com TEA.
"O objetivo social do FGTS
de proteger a dignidade humana permite o saque do fundo se o beneficiário tem
dependentes com doenças graves. Foi o que decidiu o juiz Luiz Henrique Horsth
da Matta, da 4ª Vara Federal Cível no Espírito Santo, ao autorizar o saque de
R$ 156 mil do saldo do FGTS de um trabalhador para custear o tratamento de sua
filha, que tem Síndrome de Down, autismo e transtorno alimentar. Inicialmente,
o juiz havia negado o pedido por falta de comprovação das doenças e dos gastos,
mas após a apresentação dos documentos pelo trabalhador, representado pelo
advogado David Metzker, o magistrado reviu sua decisão e permitiu o saque.
Segundo o juiz, as limitações para saque impostas pela lei que rege o FGTS não
impedem o Judiciário de fazer uma interpretação mais ampla, considerando as
particularidades de cada caso. Ele destacou que o acesso ao valor não pode ser
garantido apenas para as doenças descritas no art. 20 da Lei 8.036/90, devendo
incluir outras doenças graves, pois o rol desse dispositivo legal é
exemplificativo. O juiz argumentou que o valor depositado no FGTS pertence ao
trabalhador e tem um fim social, que é prezar pela dignidade humana, permitindo
o acesso aos recursos quando necessário, como no caso do tratamento de sua
filha.
A comunidade médica esclarece que
o autismo é um distúrbio incurável, mas seus sintomas podem ser reduzidos com
tratamento adequado desde cedo, permitindo uma vida mais próxima da
normalidade. A Lei 9.656/98, que trata dos planos e seguros de saúde, prevê
cobertura obrigatória para as doenças listadas na CID 10 - Classificação
Internacional de Doenças, publicada pela Organização Mundial da Saúde. A CID 10
inclui todos os tipos de Transtornos do Desenvolvimento Psicológico, sendo o
autismo um subtipo. A Lei 12.764/2012, que instituiu a Política Nacional de
Proteção dos Direitos da Pessoa com Transtorno do Espectro Autista, prevê
atendimento multiprofissional ao paciente diagnosticado com autismo. Além
disso, os artigos 15 e 17 do Estatuto da Criança e do Adolescente garantem o
direito ao respeito pela dignidade da criança, bem como a inviolabilidade de
sua integridade física, psíquica e moral. A legislação atual garante cobertura
a diversos transtornos do desenvolvimento, incluindo o autismo, e ao tratamento
necessário, como sessões multidisciplinares de fisioterapia, psicologia e
fonoaudiologia. No entanto, as operadoras de saúde limitam o acesso a apenas
algumas sessões anuais, o que é insuficiente para o tratamento prolongado
exigido pelo autismo. O argumento utilizado pelas empresas de planos de saúde
está no Rol da ANS - Agência Nacional de Saúde Suplementar, que prevê a
cobertura de poucas sessões de terapias. No entanto, o Poder Judiciário entende
que esse rol é exemplificativo, indicando a cobertura mínima obrigatória, e não
pode limitar o que a lei não restringe. O médico responsável pela orientação
terapêutica ao paciente é quem deve determinar o tratamento adequado. O STJ já
decidiu que apenas o médico que acompanha o caso pode estabelecer o tratamento
necessário para o paciente. Portanto, as operadoras de saúde não podem limitar
as terapias prescritas.
Em resumo, as restrições ao
tratamento multidisciplinar necessário para pessoas com autismo são abusivas e
contrariam a legislação vigente. O Poder Judiciário tem deliberado em favor dos
pacientes, garantindo o tratamento adequado e sem limitações nas terapias
necessárias.
João Neto
Advogado
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FONTES:
jurisway.org.br
jusbrasil.com.br
sabermelhor.com.br
conjur.com.br
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migalhas.com.br
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