PROBLEMA: "A seguradora se recusou a fornecer tratamento ao paciente, apesar de ele estar com os pagamentos em dia.

 

SOLUÇÃO: "O paciente possui direito ao reembolso das despesas com o tratamento, assim como dos valores pagos ao plano de saúde, além da indenização devida.

"Diante da possibilidade de confirmação de doenças de alto risco à saúde, é comum que operadoras de planos de saúde neguem a realização de certos exames e procedimentos médicos de maior valor. A justificativa geralmente se baseia na alegação de que tais procedimentos não estão incluídos no rol de procedimentos definidos por alguma resolução normativa da Agência Nacional de Saúde (ANS). Nessa situação, torna-se imperativo analisar o contrato – geralmente de adesão – para verificar se há qualquer ressalva que exclua determinadas doenças da cobertura do plano de saúde.A luta pelo tratamento de saúde já é longa e, muitas vezes, é necessário recorrer à Justiça para reparar danos ou corrigir violações à lei ou ao bom senso. Uma empresa de plano de saúde foi condenada pela 4ª Vara Cível de Campo Grande a pagar uma indenização de R$ 18,4 mil a um paciente após se recusar a cobrir um tratamento especializado para diabetes. O valor foi dividido em R$ 3,4 mil por danos materiais e R$ 15 mil por danos morais. No processo, consta que o paciente tem diabetes e faz uso diário de insulina, além de precisar de medicamentos para controlar a doença. Como consequência da doença, ele começou a ter dificuldade para enxergar e procurou atendimento médico especializado em oftalmologia. Os exames diagnosticaram retinopatia diabética moderada e o encaminharam para tratamento ocular quimioterápico com antiangiogênico. Posteriormente, o tratamento foi negado pela empresa, que alegou não estar coberto pelo contrato. Depois que o paciente pagou pelo tratamento particular, a empresa afirmou que poderia autorizar. Assim, o paciente entrou na Justiça para obter o reembolso e pedir danos morais.

Se não houver uma exclusão expressa e direta no contrato, a recusa da prestadora de serviços em cobrir os custos é considerada abusiva e arbitrária, violando diretamente o artigo 6º, inciso III, combinado com os artigos 46 e 54, § 4º, do Código de Defesa do Consumidor.

A empresa argumentou no processo que a negativa de cobertura do tratamento era legal, pois inicialmente não estava incluído no rol de procedimentos do plano de saúde. Apenas depois foi incluído e a empresa passou a autorizar a realização. Além disso, alegou que o procedimento não era emergencial, não configurando descumprimento contratual. Ao analisar o caso, o juiz Paulo Afonso de Oliveira considerou que o paciente comprovou a existência do contrato com a empresa e o tratamento alegado nos autos. "Ficou devidamente comprovado que o autor possui contrato de cobertura de plano de saúde com a requerida, e que foi receitado pelos médicos que o atenderam o tratamento com retinólogo, o que é admitido inclusive em documento produzido pela requerida". "Tabelas e rol frequentemente se desatualizam, e não se pode permitir que as operadoras de plano de saúde ofereçam aos usuários a medicina do passado. Além disso, fornecer tratamento necessário e eficaz ao paciente constitui função contratual do acordo firmado entre as partes, e sua negativa fere a boa-fé contratual", ressaltou o juiz, considerando o fato de o tratamento não constar no rol da ANS. O magistrado destacou ainda que somente o médico pode definir e prescrever os medicamentos necessários ao paciente, não sendo permitida a interferência do plano de saúde nessa questão. Sobre o pedido de danos morais, o juiz analisou que o autor "é pessoa de poucos recursos, acometida por diversas doenças, e que o tratamento em questão visava impedir que perdesse o pouco que lhe resta de visão em ambos os olhos. Além disso, precisou recorrer a parentes para custear o tratamento, gastando uma quantia que, diante do benefício previdenciário que recebe, é demasiadamente alta". Como consequência, o contratante do plano de saúde, diante desse tipo de situação, se vê impossibilitado de usufruir o que foi contratado, aumentando o risco à sua vida e fazendo com que seu tratamento ocorra em condições extremamente gravosas. Isso porque a negativa de autorização para a realização de exame ou procedimento de saúde fere a finalidade básica do contrato, colocando o usuário em uma posição de intensa desvantagem. A lista de procedimentos da ANS prevê apenas a cobertura mínima obrigatória, sendo um rol exemplificativo, o que significa que deve ser combinada com os princípios do CDC e da lei 9656/98. É certo que o rol de procedimentos da ANS não é atualizado com a mesma velocidade que surgem os avanços tecnológicos da medicina moderna, de forma que sempre existirá uma defasagem, que não pode ser ignorada, sob pena de desnaturalizar a obrigação ajustada, impedindo o consumidor de ter acesso às evoluções médicas.

Nesse sentido, a lei 9.656/98, que trata dos planos privados de saúde, estabelece expressamente, como exigência mínima de tais contratos, a cobertura de "exames complementares indispensáveis para o controle da evolução da doença e elucidação diagnóstica", conforme a redação dada pela MP 2.177-44, de 2001. Em outras palavras, o fornecimento do exame é acessório ao diagnóstico principal, sem o qual o tratamento seria inócuo, cabendo somente ao médico, profundo conhecedor da patologia, ministrar os meios mais adequados ao caso.Os pacientes da terceira idade correspondem a quase 50% das consultas oftalmológicas. Entre os problemas de visão "tradicionais" decorrentes do envelhecimento, como catarata e miopia, a incidência de uma patologia em especial vem aumentando consideravelmente nos últimos anos, assim como os processos judiciais dos planos de saúde. Trata-se da Degeneração Macular Relacionada à Idade (DMRI). Essa condição, frequentemente associada ao envelhecimento e de causa desconhecida, envolve o crescimento anormal dos vasos sanguíneos sob a retina, especificamente sob o tecido da coroide. A mácula é afetada, resultando na baixa súbita ou progressiva da visão central. Estima-se que cinco milhões de brasileiros têm DMRI em pelo menos um olho, e a cada ano surgem no Brasil cerca de 60 mil novos casos de DMRI. Outras doenças oftalmológicas, como a retinopatia diabética, afetam pacientes de todas as idades e podem levar à cegueira.O combate às doenças é realizado, entre outras técnicas, através da terapia fotodinâmica com injeções intraoculares de medicamentos de alto custo, como Avastin, Lucentis, Visudyne e Eylia. Além disso, o tratamento é frequentemente associado à realização de exames como a Tomografia de Coerência Óptica (OCT), uma tecnologia moderna de imagem diagnóstica de alta resolução, usada para diagnosticar inúmeras patologias, avaliar o curso clínico e monitorar a eficácia dos tratamentos. Muitos planos de saúde, no entanto, têm sistematicamente negado a cobertura desse tipo de tratamento. O argumento utilizado pelas operadoras é que ele não está previsto no rol da ANS ou que os medicamentos são de uso "experimental", o que justificaria a negativa. Diante dessa postura, o número de ações judiciais discutindo o dever de cobertura desses tratamentos pelos planos de saúde tem aumentado consideravelmente.

O Judiciário, por sua vez, tem reiteradamente reconhecido que os planos têm sim o dever de custear o tratamento médico indicado. A Justiça tem afirmado que o rol de procedimentos editado pela ANS não é taxativo, mas meramente exemplificativo das coberturas mínimas, não excluindo, portanto, novos e mais modernos tratamentos. Com efeito, são inúmeras as decisões judiciais que reconhecem que restrições em contratos de seguro saúde não podem inviabilizar o atendimento básico contratado; não se deve privar o ajuste de seu efeito primordial, configurando uma verdadeira cláusula perplexa, que retira do negócio sua eficácia final. A propósito, o Superior Tribunal de Justiça assentou que "o direito subjetivo assegurado em contrato não pode ser exercido de forma a subtrair do negócio sua finalidade principal" (STJ, Resp nº 735.168-RJ, DJU 26.03.2008). Por fim, deve-se considerar os princípios da boa-fé objetiva e da função social do contrato, especialmente em contratos que envolvem a prestação de serviços relacionados à saúde. Em outras palavras, se o contrato contempla a cobertura de doenças oftalmológicas, não pode haver recusa de cobertura de tratamentos específicos, sob pena de comprometer o próprio objetivo do contrato, que é assegurar o acesso a tratamentos adequados para as doenças cobertas. Diante disso, o paciente que tiver o acesso a determinada técnica ou tratamento negado pelos planos de saúde deve recorrer ao Judiciário para garantir o devido tratamento.

Portanto, não cabe à operadora do plano de saúde negar cobertura a exames destinados a completar o diagnóstico e avaliar a evolução de uma doença cujo tratamento tem cobertura prevista, pois isso daria à operadora o poder de determinar o tratamento a que o consumidor será submetido. Interpretar de forma diferente permitiria que seguradoras e planos de saúde questionassem os métodos empregados pelo médico para tratar a doença, cuja cobertura está prevista no contrato. Não se duvida que as empresas de planos de saúde podem estabelecer quais patologias não são cobertas pelo seguro e inserir essa previsão no contrato. No entanto, não lhes cabe eleger os tipos de exames ou tratamentos que considerem mais convenientes. Limitações desse tipo devem ser coibidas, pois constituem práticas ilegais, baseadas no abuso do poder econômico, em detrimento da defesa e do respeito ao consumidor.


João Neto

Advogado

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FONTES:

capitalnews.com.br

correiodoestado.com.br

campograndenews.com.br

migalhas.com.br

tj-ms.jusbrasil.com.br

paginabrazil.com

midiamax.com.br

bonde.com.br


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